quarta-feira, julho 2

POR ACABAR

O emprego
Essa coisa fundamental a trespassar-me o corpo
Aventura sob o sol espesso das gaivotas a fugir do mar.
Amostra ínfima da sociedade
Dos escorregas movidos a lágrimas,
Gargalhadas Fulminantes,
Varridela para o ridículo automatizado
Pela aromática nota espongiforme.

A movida matéria quente que abrilhanta
A experiência imunda das chávenas deslavadas
Pelo sangue frio dos clientes adormecidos
Entre passos fastidiosos no coro de prédios
Forrados a Papel vegetal.
No chão,
Lá fora,
O passado instantâneo abafa o carimbo ténue da lembrança.

A poesia do espaço caótico obriga-me a isto.
Sou servo miserável dum caminho que já faz pouco sentido,
Pseudo poeta da mestria extinta que se reformula
Numa máquina de café suja pelo passar descuidado do tempo.
No soalho inundado
Páginas misturadas de jornais e panfletos da luta pelos direitos
Moldáveis dos sonhos para a matéria.

E só depois,
As pessoas.

Um dono.

Emigrante de cuecas fio dental.
Uma empregada
Prosaica e bela,
Senhora verosímil como o camião
Que sob a circunferência ardente, resmunga com uma voz grosseira,
Metálica, mero instrumento da orquestra metropolitana.

E um tapa buracos
Viajante imóvel do vão de escadas para a clínica
Da Rasa. Desistiu de subi-las, preferiu abrigar-se.
Diz-me que,
Ainda me diz silencioso

A vida é um poço que cresce com os anos e com os erros
Mas os erros não o são nem se prevêem, vão sendo.

Tiro-lhe mais um fino e ele sorri, a cor amarga dos seus
Dentes a esbater toda a minha hipocrisia de profundezas
No micro cosmos deste salão em que ainda trabalho
Pois escrevo

O albergue dos gestos mais puros da campânula dos dias -o parolo
Da gravata altiva e tom de voz cristalino,
Arrogância platinada por um percurso à moda de fausto ou não.
O velho do jornal de notícias
E a sua cadeira que traz sempre de casa,
A cadeira e a gargalhada moral ressequida.
A mãe fumegante e opulenta e os seus dois filhos preciosos
Como aquela televisão de 82cm que figura no panfleto
Não o pode ver hoje
Está em uso debaixo da banca da louça
Impedindo o dilúvio.
Na parede
Em cima da cota de cabelo descolorado que todos os dias pede para ligar
Para um número que já não existe ou não existiu, o néon esverdeado como catarro

SALÃO DE
CHÁ DA RASA


O local onde se servem chávenas de café queimadas.

Deveria ser esta a adenda, talvez entre parêntesis
Como um delimitado corpo, rio turbulento duma torneira entupida.

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