quarta-feira, abril 25

ODE À LIBERDADE


Hoje, dia 25 de abril de 2007, comemora-se uma liberdade pela qual se lutou que não a de hoje, sendo assim, e em jeito de "comemoração", deixo aqui uma música desse nunca falecido senhor que é José Afonso.
A CIDADE
A cidade é um chão de palavras pisadas
a palavra criança a palavra segredo.
A cidade é um céu de palavras paradas
a palavra distância e a palavra medo.
A cidade é um saco um pulmão que respira
pela palavra água pela palavra brisa.
A cidade é um poro um corpo que transpira
pela palavra sangue pela palavra ira.
A cidade tem praças de palavras abertas
como estátuas mandadas apear.
A cidade tem ruas de palavras desertas
como jardins mandados arrancar.
A palavra sarcasmo é uma rosa rubra.
A palavra silêncio é uma rosa chá.
Não há céu de palavras que a cidade não cubra
não há rua de sons que a palavra não corra
à procura da sombra de uma luz que não há.

quarta-feira, abril 18

...

Desvenda e ama tudo aquilo que é belo, para assim perceberes, o quão Belo poderia ser!

sábado, abril 7

4306

Quatro e trinta e seis da manhã. Ouço um estrondo metálico. Acabo de fazer o que estava a fazer. Vou espreitar a janela aberta por causa do fumo de cigarro. Lá fora, um homem encostado a um poste em pose de quem mija para ele, começa a andar de repente; encosta a mão à parede em pose de indisposição e desespero. Parece estar bêbado, tenho quase a certeza que o está. Prossegue a passo trôpego, vai parando, barafustando, bamboleando doentiamente o corpo como quem se tenta soltar de algo. Gesticula com os braços. Pára de novo em frente a um segundo poste depois de se encostar à parede umas três vezes como quem ampara um desabamento. Prossegue. Bate surpreendido contra um terceiro; diz-lhe qualquer coisa; pára, oscilante, dobra a esquina, perde-se para lá desta minha sensação nocturna...

quarta-feira, abril 4

ADEUS! (OUTROS DIAS VIRÃO...)

Inquietação, sufocante, a de ouvir sofrer
O canto rouco consequência do viver,
Fim de linha para a sapiência
Vontade suplicante de ouvir
Melodia suave-agir,
O toque melódico da ninfa
A grandiosa Ninfa-da-Solidão…
Toque rasgado no coração, desesperado
Atónito, pedaço da minha vida;
Campainha que toca, estridentemente
Que ressoa em campânulas atentas
A gritar um S.O.S., uma impossibilidade
Uma contrariedade

-quero-te, sem te poder querer.

segunda-feira, abril 2

CÃO EUFÉMICO

Às vezes apetece-me ser cão
Para esquecer o cão que sou
Lamber o pêlo sujo
De me esfregar no chão:

Ficar limpo e Viver!

O que é pena, é ser só sonho!...

Sonho de cão, cão raivoso
Com que ladra mas não ferra
Cão que sonha com o osso
Osso que esconde, como um cão.

Quem vai à “guerra” dá e leva!
Como cão (também) é assim,
E se cão a cão ferrasse
Certa raça teria fim!

CONFISSÕES




Procuro raramente pôr no papel aquilo que é dado como belo. Não porque não goste da beleza, mas tão só e apenas porque acho que o belo é-me reservado. Não é preciso criar beleza daquilo que é belo por si só, e que, a meu ver, é mais que suficiente para me tornar num ser que respira e faz aquilo que quer. Prosseguindo. Vejo naquilo que escrevo uma certa desolação com o presente. Releio sempre o que escrevo e a meu ver são verdadeiras obras primas. O que os outros pensam de depreciativo em relação à minha forma de expressão, é para mim uma fonte de deleito e satisfação. Consegui impôr o meu ritmo, o desconforto, consegui que parássem mais um pouco para pensar, sem se camuflarem em

"tudo o que de bom tem a vida"

Seguindo em frente. Hoje em dia, há uma preocupação muito grande em ser feliz idilicamente, como se tal parafernália fosse a desculpa para a merda que nos rodeia, como se tudo isso fosse areia atirada por nós mesmos para os olhos que são nossos.

"só é cego aquele que não quer ver"

E se por vezes cego pareço, não é porque não saiba dar valor a

"tudo o que de bom tem a vida"

mas simplesmente porque não tenho medo de exprimir o meu descontentamento. Poder-se-á dizer que isso é

"bater no ceguinho"

e vendo bem talvez seja... é do género:

«ó ceguinho acorda! acorda!»

Não tenho pena dos que querem à força toda desviar o olhar de tudo aquilo que é grotesco, nada disso, é mais do tipo: tenho pena de tentarem formular uma opinião apoindo-se em meras suposições que não fazem sentido nenhum enquanto pessoa que sou. Uns, compreendem uma dor imensa, em vez de compreenderam uma forma de exprimir cristalizada pela vontade. outros, uma espécie de peditório por algo que cada vez menos procuro. Nada disso me consome, muito menos me é compreendido como algo que me atormente, somente acho que tal tentativa de compreensão é tentativa em vão.

«Não me sinto na escrita como homem que sou em vivência. Na escrita, sinto uma enorme vontade de depositar a esperança. Nas pessoas, eu incluído, sinto insuficiente esperança que necessita de ser fortificada pela palavra, sinto as pessoas com um pesado nó na garganta apertado pelo medo de exprimir aquilo que sentem e querem, verdadeiramente, em relação à vivência.»

Para concluír, e para
"não fugir com o cu à seringa"
direi com todas as certezas possíveis e encontradas que sou alguém feliz. Posso não o ser, sob o olhar de alguém prosaico, habituado à rotina que dá a cara por muitos homens, posso não corresponder aos moldes que foram projectados coerentemente pelos séculos, milénios, por aí fora, mas sou feliz comigo e para mim e isso ninguém me tira; a razão - que-não-razão - é simples:
«Procuro uma felicidade que não existe e essa procura faz-me sentir feliz, comigo próprio.»