terça-feira, setembro 9

O CAOS E A CRIMINALIDADE

Enquanto o sindicato da polícia não tiver noção que um governo não é inocente quanto à criminalidade, que as suas opções governativas acabam por influenciar a curto, médio e longo prazo, a segurança de um país, andarão a negociar com uma rede mafiosa inocente que não tem noção da sua influência socio-cultural. É certo que para perceber tal coisa é preciso tirar um curso e uma pós-graduação, e talvez isso não chegue, há quem adequado já tenha afirmado tal, apresentando medidas de prevenção para a criminalidade, e tenha passado ao lado, só porque, o que é absolutamente necessário, passa por reforçar o contingente em número e em decorações hollywoodescas. Basta olhar em redor, para esses países tão desenvolvidos e decentes à distância de uns binóculos, para ver que sim. O que é necessário, como se tem vindo a ouvir, e é mais do que óbvio, é implementar sistemas de vigilância de última geração à boa moda do ano de 1984. Comprar as mais virtuosas armas de fabrico israelita, ou americano, ou de outro país qualquer com um preço bem convidativo, de modo a facilitar, que é, o que é preciso, o orçamento de estado que, enfim, não pode viver de pão e água. Mais ainda, o que se precisa mesmo, é duma oposição oportunista pronta a virar o barco, não um barco a remos, nem a motor, mas o barco da política sempre pronto para virar sobre nós até só sair bílis. Precisamos é de apontar o dedo, dizer que as prisões têm que crescer para albergar esse bando de abutres esfaimados que nem tiveram educação para perceber que roubar é um pecado que vem na bíblia. É que é fodido, são sempre os mesmos filhos da puta, os que vêm dos bairros, sempre os mesmos como uma terrível coincidência, sempre dispostos a usufruir do rendimento mínimo e ainda a mamar por fora, e à socapa, só para não descontarem nos impostos. Fosse eu um gajo instruído e vindo duma família de classe média - coitados, andam a sofrer tanto com isto de crise, ainda por cima a serem invadidos por uma vaga que impede os seus virtuosos filhos de andar nas ruas descansados - e não escreveria nada disto. É certo, as minhas duas primeiras casas foram em bairros, mais certo e óbvio, a criminalidade existia mas não era nada de grave, não dava na TV, e na altura, não via o telejornal nem tão pouco lia o jornal. E só digo isto por uma razão muito óbvia: nunca fui grande apreciador de carros e não é por isso que não lhe dou à maneira no carjacking, também nunca fui de roubar postos de gasolina ou caixas Multibanco, e no entanto as razões são muito óbvias. Nos bairros, arruma-se para cantos pessoas como quem usa uma vassoura e um apanhador, muitos dos seus moradores saem do bairro para ir ao shopping ver as montras reluzir e apreciar os caprichos mais belos dos tempos modernos. Às vezes faz-se um intervalo e fuma-se uns charritos na escada de incêndio para curtir mais a onda da coisa. Nos bairros, muitos de nós moradores, enquanto crianças ou adolescentes, não tivemos um pai, ou talvez uma mãe que, ou morreu ou trabalha muito, ou vende droga na sombra, ou até que dá o pito ou cu, ou se calhar até não faz nada e vive do rendimento mínimo como uma vampira que suga o sangue que dá saúde ao orçamento de estado. E quando falo dos mais novos lembro que todos eles: mães, pais, filhos, avós, cães, gatos, hienas, leões, elefantes, crocodilos, etc, tem um passado que não se coaduna com as normas imperiais de bom senso e etiqueta, e o problema é só esse. Se ao menos se preocupassem em criar uma sociedade desprovida de poços de descriminação - de Frankensteins inocentes ao ponto de fazer mossa na cabeça mais racional -, a sociedade, com todos os seus defeitos inerentes, irreparáveis do ponto de vista mais absoluto, seria bem mais justa e equilibrada para o acusador e para o acusado. O acusador, que só acusa porque o medo é grande, aprenderia que o mundo não é assim tão assustador, as suas criancinhas, coitadinhas, deixariam de ser florzinhas de jardim de condomínio fechado, talvez até aprendessem a fumar uma brocas depois dos homens-aranhas e das winxs tão queridas e angelicais. Quando ao acusado, deixaria de ser marginalizado e enraizado ao seu meio antropologicamente violento. Claro que para tudo isto funcionar não seria pêra doce. Belíssimo, é acusar e tentar remediar a criminalidade com mais efectivos policiais e encher a prisões até à rolha, e depois - mesmo sabendo que não há dinheiro para a educação, facto comprovado pelos contentores das docas que chegam às escolas como uma sala de aula nova por estrear - investir na construção de mais prisões, mas daquelas miseráveis como qualquer infame criminoso merece para sentir o peso do erro, o dele e o dos seus criadores. Há quem já tenha aberto o olho, dou um exemplo: o bairro do Aleixo, no Porto, encontraram a solução!, vão deitar abaixo as torres da droga e vão dissolvê-los pela cidade em bairros que, ou já estão construídos, ou estão por construir; essa é a solução!, levar no cu até não se poder mais! Peço desculpa pela minha agressividade, os meus pais embora me tenham transmitido valores preciosos, não conseguiram criar um filho com grandes ambições. Não acabei os estudos por preguiça, estou desempregado porque não quero trabalhar, e os call-centers são um sonho para mim. Já me candidatei a um hiper-mercado, a uma empresa de prospecção de solos, a diversas empresas de trabalho temporário que só nos dá direito a trabalhos de sonho, e só não entrei em nenhuma delas, porque não tirei a licenciatura. Resumindo, acabe-se com este lamurio construtivo e caótico: só não sou ninguém, não anseio nada, porque a máquina de estado e o esforço dos meus pais trataram de me por longe dos bairros de onde parti. E lá, só viviam animais capazes de deitar por terra os meus mais promissores e vagos sonhos.

Sem comentários: